Resenha de Livro
Curso de Formação em Terapia Relacional Sistêmica
Psicóloga Solange Maria Rosset

 

Nome do Livro:

A linguagem do encontro terapêutico

 

Autor do Livro:

Maurizio Andolfi

 

Editora, ano de publicação:

Artes Médicas – 1996

 

Relação dos capítulos

Capítulo 1: Introdução à epistemologia

Capítulo 2: Conceitos-chave para a compreensão do encontro terapêutico

Capítulo 3: O triângulo como unidade mínima de observação

Capítulo 4: O encontro terapêutico como um espaço de diagnóstico e mudança

Capítulo 5: A posição do terapeuta relacional no encontro terapêutico

Capítulo 6: Perguntas, redefinições e hipóteses relacionais

Capítulo7: A linguagem do corpo e o encontro terapêutico

Capítulo 8: O silêncio no encontro terapêutico

 

Apanhado resumido sobre cada capítulo

Capítulo 1: INTRODUÇÃO À EPISTEMOLOGIA

Este capítulo aborda o histórico das fases do pensamento científico que deram suporte teórico para Psicologia, como também o trajeto concomitante da Psicologia Relacional até a epistemologia da segunda cibernética.

Os progressos da ciência: do modelo de explicação causal ao modelo de explicação informativo

Paradigma Racionalista: método dedutivo de causa e efeito.

Paradigma Empirista: observação de como os eventos são ligados entre si.

Paradigma Probabilista: a observação é resultado dos parâmetros do observador.

Primeira cibernética e segunda cibernética: rumo à complexidade

A primeira cibernética diz respeito a visão circular e de processo dos fenômenos do ser humano.

A segunda cibernética traz um conceito no qual são considerados aspectos de segunda ordem como: o cognitivo, o diálogo e a interação sócio-cultural.

A linguagem: possibilidade de encontro entre sistema “observador” e sistema familiar

A interação no setting terapêutico entre o terapeuta relacional e o sistema familiar possibilita a construção compartilhada de uma nova realidade dos significados levando a família a uma organização mais funcional.

Capítulo 2: CONCEITOS- CHAVE PARA A COMPREENSÃO DO ENCONTRO TERAPÊUTICO

Sócrates, via no encontro terapêutico uma maneira de conhecimento chegando a novos argumentos e conclusões diferentes das já alcançadas. O pensamento desse filósofo da antiguidade  é coerente com o método que,  por meio de informações  significativas, propõe hipóteses e novas conexões possibilitando o auto-conhecimento e promovendo as potencialidades humanas.

Definição de encontro terapêutico:

O encontro terapêutico clínico, tem como objetivo elucidar o modo característico de viver do cliente em questão. Assim o encontro terapêutico movimenta-se sobre dois caminhos paralelos: o das realidades individuais e dos aspectos de relação. É preciso ter uma idéia clara da pessoa e daquelas que a rodeiam e das modalidades típicas de relação.

O encontro terapêutico e a estrutura multicontextual:

A Psic. Relacional reconhece a importância dos aspectos históricos, pois os indivíduos e seus sistemas são vistos no presente como fruto de sua história passada e da tensão em relação ao futuro.  Deve ser considerado o patrimônio interacional que as pessoas adquiriram com os anos, dando relevância aos elementos subjetivos (lembranças, expectativas,intenções...) do tempo vivido, tanto individualmente como socialmente.

No encontro terapêutico acontece uma conversação, voltada para formular diagnósticos em uma dimensão trigeracional-evolutiva, tornando o encontro frutífero pelo fato de mobilizar nas pessoas algo que lhes permita renovar percepções, idéias, fantasias sobre o próprio modo de sentir-se em relação aos outros. Para este propósito são feitos questionamentos no presente que permitem ativar memórias e percepções e movimentos que dizem  respeito a outros tempos, para que se comece a sair daqueles “obstáculos evolutivos” que criam desconforto e sofrimento.

Conteúdo e evolução do encontro terapêutico:

Interação refere-se à troca que surge no “aqui - e - agora”.

As relações não diferem somente naquilo que os participantes fazem em conjunto (conteúdo da relação), mas também em como fazem (qualidade da relação)  por exemplo, na intensidade de uma interação.  Esta última depende da emotividade das relações que evoca nas pessoas envolvidas e manifesta-se, sobretudo, por meio dos aspectos não verbais do comportamento e não está estritamente correlacionada com a própria relação.

Processo: o tempo e o desenvolvimento de uma relação (sucessão de fatos).

Relação Terapeuta – Cliente: encontros terapêuticos sucessivos.

Os tempos do processo são tanto organizativos - representados pelo tempo da sessão, do intervalo entre uma sessão e outra, quanto internos - referem-se ao tempo interno necessário a cada componente da relação para intervir, assimilar, elaborar.

O processo é um procedimento descontínuo (alternar-se das sessões), cujo continuum é dado pela coerência de um método de observação, de análise e de intervenção. No processo é fundamental considerar a sucessão dos eventos.

Os conteúdos representam o significado de uma relação, porém conteúdo e relação nem sempre caminham de maneira sincronizada. Ex: não dar flores a uma mulher ou dar em uma ocasião especial, significa dar conteúdo e, portanto qualificar a relação. No entanto pode que a mulher não dê ao gesto significado importante, assim por meio de análise dos comportamentos observa-se os conteúdos contextualizando-os com base nas observações feitas e com relação à subjetividade dos participantes. 

Capítulo 3: O TRIANGULO COMO UNIDADE MÍNIMA DE OBSERVAÇÃO

Da díade à tríade: Para ampliar o foco de observação, muitos  autores sistêmicos consideram o triângulo  como a unidade mínima de  observação, como um esquema mental  por meio do qual se recolhem informações sobre um sistema.

Bowen(1979), compreende o conceito de triângulo como instrumento que permite descrever a dinâmica das relações dentro de um sistema emocional, com suas tensões  e seus equilíbrios, explicando o processo dinâmico interno de um sistema emotivo.

A família ao apresentar um problema, o explica dizendo respeito à díade: Estou deprimida porque meu filho nunca está em casa. Ao contrário, o proposto sistêmico de que “o mais complexo explica o mais simples” permite construir hipóteses que pelo fato de serem pelo menos triádicas se colocam em um nível diverso, ampliando o campo de observação.

A descrição de um problema por parte de uma família é um sistema semântico que contém uma trama O QUÊ, personagens QUEM, e uma situação ONDE e QUANDO. (Sluski,1991). O terapeuta relacional por meio de perguntas, afirmações ou outros procedimentos tentaobter uma transformação na história, deixando para família hipóteses alternativas possibilitando uma pontuação diversa dos eventos ligando o  QUEM, o QUÊ o ONDE e o QUANDO, de maneira diferente daquela narrada pela família, criando possíveis chaves interpretativas. 

No encontro terapêutico o terapeuta deve evidenciar os nexos e as ligações entre o sistema e o contexto particular que se apresenta. Os diferentes significados que tiveram valor com o tempo, analisando a relação entre sintoma e organização atual do sistema em relação ao tempo passado, presente e futuro (Telfner,1991).

O terapeuta pode colocar mentalmente pessoas ausentes, lembranças e expectativas, criando conexões entre entidades de qualquer natureza, uma vez que estas se encontram em relação significativa, colocando-as metaforicamente nos pólos do triângulo e visualizando a relação pela união com os vértices.

O terapeuta pode criar conexões perguntando aos diferentes componentes do sistema seu parecer sobre o que está sendo tratado bem como sobre a relação de um segundo indivíduo tem com um terceiro, fazendo perguntas sobre outros ausentes, coletando elementos significativos comum aos três, repropondo tudo em uma pergunta que faça com que o interlocutor pense.  O fato de se experimentar em posições relacionais diferentes permite aos membros do sistema sair do script familiar, no qual cada um possui um papel definido com base no significado atribuído a este script da rede de relações.

Inserir a dimensão do tempo significa ter uma ótica trigeracional, pois os triângulos não são limitados somente a segunda e terceira gerações, mas podem se estender também à primeira.

O genograma como mapa dos triângulos intergeracionais:

Frente a um genograma o terapeuta poderá visualizar a estrutura familiar, de pelo menos das três últimas gerações. Este instrumento facilita para o profissional entender as ligações significativas nos planos geracionais, sendo a estrutura triangular a unidade de medida.

Os mitos como intersecções de histórias familiares:

O terapeuta cria um entrelaçamento entre níveis diversos para ter um quadro do funcionamento da família e da grande rede de relações no seu interior, investigará então mitos familiares, regras e valores para ver como estes foram transmitidos de uma geração para outra.

O terapeuta relacional sistêmico observará a capacidade que o indivíduo teve de desligamento, maturação, de renovação de casal, ou seja, quanto este casal conseguiu construir uma realidade relativamente independente dos processos de pertencer com uma ou outra família. A capacidade de diferenciação da família de origem está ligada à maior ou menor flexibilidade dos “triângulos geracionais”. Usando a estrutura triangular pode-se estudar um tipo de normalidade ou de bloqueio evolutivo nas últimas gerações observando como são construídos os mapas de pertencimento e como são transmitidos os modelos de comportamento, de cuidados e de adaptação.

O confronto entre três planos geracionais permitirá evidenciar modalidades relacionais e distribuição de papéis já utilizados nesta geração como nas passadas. Podem existir ligações e obrigações definidas como “lealdades invisíveis” (Boszormenyi-Nagy e Spark,1988).

Tais lealdades verticais podem ser tão fortes que conseguem desenvolver nas gerações sucessivas algo denominado “liberdade não livre de agir”. É o que acontece nos adolescentes rebeldes que por oposição às regras e aos mandatos dos genitores efetuam um corte emotivo do sistema familiar que de fato não consiste em uma diferenciação da família, mas em uma fuga que poderá levar à repetição de modelos relacionais dos quais se procura escapar.

Corte Emotivo - aquisição de maturidade precoce adquirida paralelamente a um sentimento de reivindicação do que faltou – cedo ou tarde procurará uma compensação, buscando por exemplo,  uma pessoa que  reproporá  uma espécie de prisão.

É importante observar como a estrutura familiar evoluiu com suas regras e mitos ou se permaneceu estagnada na evolução do tempo.

Capítulo 4: O ENCONTRO TERAPÊUTICO COMO UM ESPAÇO DE DIAGNÓSTICO E MUDANÇA

O diagnóstico sistêmico relacional:

No início de um encontro terapêutico, o terapeuta por meio de perguntas vai obter informações sobre a história familiar do indivíduo, como ele estruturou sua personalidade, se casal, como se conheceram, grau de instrução, no que trabalham. Dados sobre o ciclo evolutivo de cada um, como nascimentos, mortes, casamentos, separações, saúde dos progenitores, como também questões sobre as tradições, cultura e realidade econômica de cada um.  Tais dados possibilitam ao terapeuta avaliar o nível de diferenciação de cada um em relação sua família de origem, bem como o potencial desta família como sistema de intimidade.

Com as informações recebidas o terapeuta pode fazer um diagnóstico e propor uma visão diferente da realidade, onde as informações permanecem, porém com novos significados e funções.  Sendo assim a família pode conhecer outras alternativas de escolha, que  promoverão  sua mudança pelo movimento no processo evolutivo da família.

Início do processo avaliativo:

Desde o primeiro contato do terapeuta com a pessoa que solicita terapia tem início o processo avaliativo. Análise do pedido feito e o significado a ele atribuído, questões que o levaram procurar terapia, podendo o terapeuta construir hipóteses sobre as relações do cliente. Informa o cliente que as mudanças serão possíveis a partir da potencialidade própria para realizá-las.

Nos primeiros encontros terapêuticos, quando família e terapeuta vão se conhecendo, é possível formular mais hipóteses, colocando-as de diferentes maneiras levando a nova realidade, por exemplo; ao pensar um mesmo indivíduo ora como filho, ora como irmão é possível formular hipóteses mais complexas sobre seu comportamento. O terapeuta é o facilitador para que conteúdos significativos do cliente venham à tona.

Coleta e transformação das informações:

O terapeuta entra em contato com a realidade do cliente por meio de suas descrições, podendo descobrir o que ocasiona crise no seu sistema cognitivo.  No entanto é necessário ampliar a descrição criando novas conexões, saber como os fatos são elaborados, (sozinho ou com outras pessoas, em quanto tempo, de que maneira, com quais emoções), os seus significados e as emoções que suscitam, para que nas sessões terapêuticas, pela reelaboração  das informações proporcionar um novo equilíbrio emotivo  ao cliente.

Capítulo 5: A POSIÇÃO DO TERAPEUTA RELACIONAL NO ENCONTRO TERAPÊUTICO:

O observador relacional como parte do sistema:

A teoria construtivista e o pensamento sistêmico trazem um novo olhar sobre o encontro terapêutico, onde o terapeuta relacional passa a fazer parte do sistema que está sendo observado. Uma estrutura triangular pode  ser utilizada pelo terapeuta relacional para entrar no sistema, ele será um dos pólos,  ocupando diferentes posições  que poderão remetê-lo a uma experiência,  semelhante a vivida pelo cliente, possibilitando uma porta de entrada no sistema e possibilidades alternativas de relação.

Ressonância Emotiva:

A cada sessão terapêutica o cliente entra em contato com o seu conflito, onde vive momentos de participação mental e emotiva. O tempo pode tornar determinadas situações rígidas, o que acarretará dificuldade para superar um modo de relação pelo fato da emoção estar em predominância. Quando terapeuta reflete com o cliente sobre o significado dos seus envolvimentos emotivos e afetivos perante ao que está sendo trazido na sessão, lhe possibilita um melhor entendimento do problema, não se afastando das situações.

Disponibilidade para escutar e empatia:

A escuta pressupõe capacidade empática, compreender o outro do seu ponto de vista permitindo o acesso de tudo que ele traz. O silêncio na sessão terapêutica também é importante e produtivo no sentido de assimilar um conteúdo. A escuta no encontro terapêutico é uma escuta ativa, onde o terapeuta participa nos aspectos significativos que o cliente diz e faz.

As palavras transmitem conhecimento e sentimentos. Uma linguagem simples possibilita que o cliente tenha a sensação de que está sendo compreendido, bem como, faz com que ele compreenda o que quer comunicar. Ex: uma frase como: “sinto uma inquietação profunda enquanto me conta sua decisão de ir embora de casa” – é um exemplo de como uma breve afirmação pode refletir um estado de espírito, introduzir informações, talvez desconhecidas pelo cliente.

Respeito:

O respeito é demonstrado prestando-se atenção a pessoa e seus problemas, valorizando sua unidade como ser humano. Respeitar os problemas do cliente significa, avaliar a gravidade do que ele traz, partindo das suas considerações.

Quando o terapeuta está a frente de indivíduos de diferentes sexos e gerações, o conceito de respeito é ampliado. Ele terá que empatizar com o conjunto não interferindo na relação de uma geração com a outra, pois a confiança entre os indivíduos nasce quando sentem-se  considerados na sua singularidade de maneira igualitária.

A dúvida como modalidade de compreensão:

Para entender a complexidade de um sistema é necessário evitar simplificações, tendo o terapeuta a capacidade de tolerar a ansiedade pela não compreensão. O terapeuta não deve pensar em uma única hipótese. Deve estar aberto para a mudança, mantendo-se em um estado de incerteza evitando fechar-se para perguntas que levem para outras direções.

Reciprocidade social e comunicação transcultural:

A realidade do encontro terapêutico se construirá conforme as expectativas e idéias individuais ou do grupo, as quais estarão de acordo com contexto social ao qual pertencem.

A comunicação transcultural é difícil no sentido de que os indivíduos acreditam que as visões de mundo que possuem são universais, podendo levar a mal entendidos, quando em interação com outra cultura.  A reciprocidade ocorre quando se consegue considerar a perspectiva do outro.

Coerência, intensidade, criatividade:

Para que o encontro terapêutico siga de maneira coerente, ou seja, sem contradições, é necessário que o terapeuta estabeleça um diálogo significativo, rico em informações e possibilidade de perguntas unindo a teoria e a prática.

Considera-se intensidade o interesse do terapeuta pelo outro e o grau de motivação para com a relação. O terapeuta pela metáfora, humor e expressões de criatividade pode aumentar a intensidade da relação.

Capítulo 6: PERGUNTAS, REDEFINIÇÕES  E  HIPÓTESES RELACIONAIS:

Os pontos nodais na construção dos significados:

Tendo o terapeuta passado por diferentes experiências de vida e formação cultural, bem como o sexo do profissional, colaboram para transmitir um novo modo de pensar e perceber os problemas trazidos pela família, possibilitando novas soluções. No entanto é necessário que o terapeuta perceba os significados das tradições, mitos e convicções da família para cada membro do sistema familiar.

Ao ouvir a história da família o terapeuta relacional reorganiza alguns pontos nodais, propondo novos significados e conexões. O fio condutor da transformação do conteúdo familiar, será a criatividade equilibrada entre o velho e o novo, que vai se desenvolvendo em cada sessão terapêutica.

As perguntas relacionais: 

As perguntas relacionais têm o intuito de explorar como um sistema se relaciona, para possibilitar compreensão de seu funcionamento. A pergunta feita pelo terapeuta relacional sistêmico não é para receber uma informação, mas criar uma ligação com o cliente.
A pergunta tem dupla função. Para o cliente comunicar algo de sua vivência e para o terapeuta compreender o pedido do cliente.

Na construção das perguntas relacionais existem dois conceitos-chave: circularidade e significatividade.  Circularidade é a formulação progressiva de perguntas que trazem respostas informativas  e também a estrutura da relação na qual o cliente se baseia. Sendo assim, não existem perguntas pré-estabelecidas, mas de um lado, a possibilidade de  construção de uma relação refletindo a subjetividade e interesse do terapeuta e do outro lado  a do cliente e suas relações familiares. 

O processo de redefinição e de formulação de hipóteses:

As perguntas relacionais permitem a ampliação das questões trazidas pela família, possibilitando a redefinição do problema, tornando a família autora de sua mudança.

A formulação de hipóteses possibilita uma condução adequada da sessão terapêutica, pois são baseadas nas informações que o terapeuta recebe, podendo ser substituídas por outras mais adequadas à situação. As hipóteses poderão ser sobre as motivações e sobre as intenções que acompanham as relações dos membros familiares.

Capítulo7: A LINGUAGEM DO CORPO E O ENCONTRO TERAPÊUTICO:

As mensagens corporais no campo relacional:

Para o terapeuta relacional sistêmico, o movimento e a posição do corpo das pessoas conforme o contexto de interação podem ser uma linguagem de referência como manifestação de elementos psicológico-relacionais.  O comportamento não verbal poderá ser observado tanto nas relações hierárquicas (eixo vertical) ou na distribuição de papéis e funções no casal (eixo horizontal).

A emoção que permeia as relações e a valorização das comunicações silenciosas possibilita reviver a experiência do outro, colaborando para seu conhecimento interno, ou seja, a empatia.

No setting terapêutico a codificação não verbal do terapeuta, indicando atenção e apoio, é fundamental na estruturação desta relação, transmitindo consideração e interesse. Também  pela expressão corporal da família o terapeuta pode perceber como suas colocações estão sendo acolhidas.

Corpo e linguagem: dois termos, uma ligação

A palavra corpo pode ter diferentes significados. O corpo humano, o corpo de um projeto como também ao referir-se a objetos e pessoas como pertencentes  a um grupo, fazendo parte.

O corpo familiar é representado pelas relações entre as pessoas e também entre as gerações onde existem valores comuns que são compartilhados.

A linguagem do corpo é ampla e complexa, implicando na sua interpretação o contexto onde ocorre, a finalidade que a comunicação quer alcançar e o que é percebido entre os interlocutores. Uma avaliação holística do evento comunicativo é necessária não subestimando o tom de voz, a expressão facial, bem como aspectos subjetivos que inconscientemente se manifestam de diferentes relações do presente e o do passado. Sendo assim todas as manifestações do organismo tem sentido na inter-relação dos aspectos psicológicos, biológicos e sócio-ambientais.

Os sinais corporais nas trocas interpessoais:

Os sinais corporais podem ser subdivididos em: que exprimem emoções, comportamentos interpessoais e aspectos da personalidade.

Os sinais emocionais podem ser percebidos pelas expressões faciais, como mudança no olhar, da boca, das sobrancelhas, dos músculos da face, pois é a área mais imediata de sinalização de emoções, como surpresa, interesse, felicidade, distância ou intimidade.

A pele também pode refletir estados psicológicos, como o rubor ou palidez.

Os gestos podem exprimir emoções, que algumas vezes não podem ser transmitidas verbalmente. Os gestos podem também indicar adaptação. Auto-adaptativos, focado no próprio corpo (ex: mexer nos cabelos), centrados no outro (engatar-se no braço do outro) e sobre objetos (brincar com um chaveiro).

A maneira como o indivíduo fica em pé, apóia-se, ou seja, a sua postura durante uma interação, pode expressar sensações e emoções. É possível observar quando da mudança de posição de braços abertos para cruzados, que a sua movimentação externa está vinculada a sua movimentação interna.  

A maneira de vestir também pode ser um indicador do estado psicológico do indivíduo. Quando seu aspecto exterior se transforma no decorrer do processo terapêutico, pode representar elaboração da própria história conforme a variação das emoções, bem como, nova maneira de estar na relação.

Sinais que exprimem comportamentos interpessoais: Nas interações interpessoais, o olhar pode ter  diferentes  significados,  pela  sua intensidade e direção, pelo  evitamento demonstrando  indiferença e  expressão de poder na interação entre duas pessoas.

O contato físico é a forma primária de interação. Importante na infância para conhecimento do mundo permanece como maneira relevante de comunicação no decorrer da existência, de diferentes formas, conforme as circunstâncias. É sempre o contato com outro em determinada relação, sendo um contato externo.

Também ocorre o autocontato, pequenos gestos do indivíduo em si mesmo, nos cabelos, mãos, que seria uma busca de conforto em interações tensas. O autocontato pode também refletir uma carência de intimidade nas relações, sendo que o desejo de proximidade poderia ser satisfeito acariciando o próprio braço, um bichinho de estimação ou fumando.

É o contato que possibilita que cada um supere as barreiras protetoras que cria em torno de si.

Sendo o corpo território privado de cada um, quando o indivíduo sente-se invadido, tem a tendência a levantar uma barreira para o outro, podendo ser representada pela colocação das mãos em frente ao corpo.

Neste processo de aproximação cotidiana existem momentos imprevisíveis, por conta das situações ou pela cultura, propiciando uma demonstração de identidade e um desejo de reconhecimento.

Os comportamentos interpessoais podem demonstrar submissão, amizade, hostilidade. A maneira como as pessoas se situam no espaço em relação à outra, pode indicar relações de hierarquia, intimidade ou colaboração participando, involuntariamente, no processo de interação e comunicação interpessoais.

Sinais de personalidade: Segundo Argyle (1978 apud Andolfi), a personalidade também participa no processo comunicativo, sendo o aspecto físico do indivíduo fator significativo. No entanto as zonas corporais do indivíduo podem não estar em equilíbrio com sua aparência física. Estas antíteses aparentes contam a história de vida da pessoa, formadas pelas suas experiências emotivas conflituosas no decorrer do seu crescimento e que o acompanham também nas relações.

Tal fato, demonstra a interdependência entre o intra-individual (interno) e interpessoal (externo), permitindo uma melhor compreensão das pessoas com as quais interagimos.

Para estudo do comportamento social é necessário analisar não só o comportamento individual, mas também as interações, as relações e a estrutura do grupo, não esquecendo fatores como, afetivo-cognitivo que atuam concomitantemente.

Metacomunicar com o corpo:

Pela linguagem do corpo são transmitidas informações do mundo interpessoal, emotivo e características da personalidade do indivíduo, como também sobre o contexto destas informações. Segundo o autor as mensagens não verbais comunicam em diferentes níveis num processo de influência recíproca.

A Escola de Palo Alto postulava a comunicação com dois sinais, digitais e analógicos  (linguagem do corpo).  Sendo o primeiro o conteúdo da comunicação (plano de conteúdo) e o segundo, definindo a relação com o outro (plano das relações).

Atualmente sabe-se que tanto a comunicação verbal como a não verbal trazem uma parte de conteúdo e uma parte de relação. Informações de conteúdo podem definir o contexto das informações fornecidas – metacomunicação.  No entanto pode o contexto também modificar o significado do conteúdo – circuito recursivo. Para análise é necessário observar o contexto, o significado dos acontecimentos, a dimensão dos fenômenos, os elementos culturais e história pessoal.

Espaços do corpo e limites relacionais:

Espaço do corpo é a dimensão espacial do indivíduo (espaço pessoal), onde os limites em relação às distâncias interpessoais são invisíveis. A violação deste espaço, conforme o sexo, contexto social e cultura pode ser considerada uma invasão, podendo suscitar sentimentos que criem confusões, antipatias ou simpatias.

Quando duas pessoas se encontram, define-se o espaço de interação seguindo regras de relação. É um espaço intermediário onde os corpos entram em contato, podendo ser por um sorriso, saindo para voltar ao seu espaço pessoal.

A parte mais privada do indivíduo é chamada de espaço interno, que pode ser difícil exteriorizá-lo. O espaço interno de cada um tem referências do seu meio familiar através das gerações. A articulação do espaço pessoal é coerente com o mundo interno do indivíduo.

Quando existe dificuldade de comunicação o espaço interno se enrijece, em contrapartida aquele que se deixa invadir pelo mundo externo fica sem defesas. Estas variáveis pessoais são determinadas pela idade, contexto, valores sócio-culturais que permeiam aproximação/distância nos relacionamentos. Quando o indivíduo tem clareza do seu espaço pessoal, mais flexibilidade na interação, sendo que quanto mais aberto o espaço pessoal maior possibilidade de ficar a mercê do espaço de interação.

Os diferentes momentos do ciclo vital são caracterizados por alterações nas relações familiares, o que acontece também nas relações espaciais. Tais alterações favorecem o processo separação-individuação propiciando o desenvolvimento pessoal.

Uma distância saudável entre os membros familiares se dá através de limites flexíveis e claros que favoreçam, ao mesmo tempo, a autonomia individual e sentimento de pertencimento ao núcleo familiar. Também a hierarquia, constituída pelos níveis geracionais, regula as distâncias da família.

Os ritmos da comunicação não-verbal:

Junto com as características pessoais de cada um, também se desenvolve uma cadência própria, ou seja, ritmos da comunicação. Para que os indivíduos entrem em sintonia são necessários ajustes recíprocos, tanto na comunicação verbal como na não verbal, de ritmo e de velocidade.

A linguagem do corpo no encontro entre gerações:

A linguagem do corpo pode expressar uma comunicação inconsciente, estruturando de maneira particular uma relação, satisfazendo a necessidade de ambos, por exemplo, a relação pai e filho. Com o passar do tempo o filho torna-se adulto, no entanto, o comportamento de respeito será mantido ficando evidente pela maneira como dispõe o seu corpo.

É necessária a flexibilidade e adequação desta interação na passagem dos ciclos vitais, para conquista de modalidades interativas mais maduras.

Pela linguagem do corpo, comportamento não verbal, é possível ter uma perspectiva da dinâmica das relações, reconduzindo a situações características das faixas evolutivas mais determinantes do indivíduo e seu grupo familiar.

A maneira como a família se apresenta, ou seja, sua a linguagem corporal permite ao terapeuta uma imagem inicial da organização emocional e relacional do sistema.

Capítulo 8: O SILÊNCIO NO ENCONTRO TERAPÊUTICO:

No encontro terapêutico o silêncio é elemento integrante da entrevista, tornando-se significativo como a palavra.

O silêncio do terapeuta, significando disponibilidade para ouvir e compreender as dificuldades do cliente no aqui-e-agora, o estimulará a relatar o que lhe incomoda.

O silêncio como escuta:

Todo ser humano precisa comunicar e quer ser escutado, sendo que na comunicação verbal ocorre uma colaboração entre quem fala e quem escuta.

Para poder escutar o terapeuta tem que suspender suas crenças e experiências vividas, respeitando as diferenças de visão.

O silêncio como escuta, permite ao terapeuta refletir a respeito da subjetividade de cada membro presente na sessão terapêutica e possibilita à família a expressão da emotividade.

O silêncio como pausa:

Numa sessão terapêutica, o silêncio e a pausa podem ter diferentes significados.

A pausa pode bloquear a fluência das palavras ou levar a um pensamento. O silêncio pode oportunizar a expressão.

A pausa pode caracterizar um controle quando é acompanhada por expressões do rosto ou de uma postura firme, ou uma emoção quando a pessoa não responde prontamente, e no seu silêncio acompanha um rubor de face.

A pausa também pode acontecer quando a pessoa ao estiver falando, e lhe vir a mente alguma lembrança fora do conteúdo do seu discurso. Frente a esta descontinuidade, ela pode ser chamada a prosseguir ou o silêncio facilitará a retomada do discurso.

O silêncio para o terapeuta relacional:

É necessário a família saber que o silêncio da terapeuta significa atenção e acolhimento ao que está sendo relatado.

No silêncio o terapeuta poderá:

- ordenar e compreender o que ouviu, devolvendo para o cliente em termos relacionais os conteúdos emersos e implícitos,

- refletir e levantar hipóteses e intervir de maneira coerente

- organizar a estratégia que utilizará na terapia, a escolha do tempo, metáforas, tonalidade de voz e postura,

- o silêncio para fazer emergir livremente a maneira de agir dos membros familiares no cotidiano familiar,

- o terapeuta pode fazer intervalos na comunicação da família para chamar atenção de como o que foi dito traz a tonaalgo em cada um, interferindo nas relações.

O silêncio da família:

O silêncio na entrevista pode significar algo com a história de vida do indivíduo (segredos do sistema familiar), com o que está acontecendo no momento (dificuldades do ciclo vital) e com a relação que é estabelecida com o terapeuta.

Pode ainda o silêncio da família ser motivado pelo fato de um membro da família não querer dar resposta ao terapeuta, situações de emoções muito fortes para a família ou quando o que o outro diz não é compreendido.

 

Apreciação pessoal sobre o livro

O conteúdo do livro remete o leitor à riqueza do contexto terapêutico, onde o cliente com as diferentes linguagens expressivas traz suas dificuldades.

Ao terapeuta mostra a necessidade da amplitude de olhar, sem juízo de valores, observando as influências geracionais que podem estar interferindo nas relações do sistema familiar.

 

Nome do autor da resenha e data: Delia Maria Rocha Avila – Abril 2011.