Resenha de Livro |
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Nome do Livro: |
Pais, Filhos & Cia Ilimitada |
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Autor do Livro: |
Gladis Brun |
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Editora, ano de publicação: |
Editora Record/1999 |
Relação dos capítulos
Introdução ou a arte de viver em família
Cap.1 - O amor pode vencer tudo?
Cap.2 - Casar de novo: somar ou diminuir.
Cap.3 - Fraldas, outra vez?
Cap.4 - Rituais : vou de "saia justa"
ou "à vontade".
Cap.5 - Madrasta ou má-drasta?
Cap.6 - É feio falar em dinheiro?
Cap.7 - Avós, linha de frente ou retaguarda
afetiva?
Epílogo
Apanhado resumido sobre cada capítulo
Introdução ou a arte de viver
em família.
As famílias se constituem e separam de
forma bem diferente de antigamente.
Hoje existem casais que moram em casas separadas,
casais homossexuais com filhos de casamentos anteriores, famílias com
crianças de diferentes sobrenomes. Aumentou
o número de famílias uniparentais e o trânsito entre a casa
do pai e da mãe se intensificou.
A função do terapeuta nesta conjuntura
é ajudar as pessoas a encontrar e a negociar melhor seus lugares.
Estas transformações não
acabaram com a família, apenas mudaram o perfil e o traçado de
suas relações.
A autora aponta que o livro sugere um olhar sobre
a turbulência ocorrida com os afetos desfeitos e refeitos nas famílias
de recasamento.
Um novo casamento é esperança e
desafio, já que muitos obstáculos tem que ser enfrentados, entre
eles, o de reformular os conceitos, as comparações, as leis, os
parâmetros e os ângulos dos quais costuma-se olhar a experiência
legítima de cada um para tentar ser feliz de novo.
Gladis Brun coloca que o livro é o resultado
de sua experiência, é ela mesma, porém não trás
soluções mágicas para salvar relações, mas
levam à reflexão sobre os desafios a enfrentar e para manter acesa
a esperança de um casal que inicia sua tentativa, de mais uma vez, ser
feliz na vida.
Cap.1- O amor pode resolver tudo?
Um dos aspectos complexos do recasamento é
a dinâmica das novas relações que se estabelecem a partir
dele. Outro fator que aumenta o desafio em relação a um casamento,
refere-se à população numerosa que está associada
a este novo tipo de família.
A incerteza de quem vem jantar, fulano vai dormir
aqui hoje ou não, etc... exige um grande investimento para que as pessoas
se organizem. São tantos horários de visitas internos e externos
a serem agendados.
Geralmente o casal envolvido nesta nova união
minimiza as dificuldades decorrentes deste ato, nem sempre vistas da mesma forma
pelo restante do sistema.
A fantasia de que o amor pode tudo geralmente
conduz à decepção.
Quando falamos em recasamento, pressupõem-se
que possíveis episódios dolorosos e, algumas vezes, até
traumáticos podem ter ocorrido ante da relação atual.
A família do recasamento inicia sua história
num álbum de várias páginas preenchidas, e dependendo da
realidade do novo casal, pode tomar formas bem diferentes; deste modo, na formação
desta família os dois já podem ter sido casados, ou só
um, ambos têm filhos ou só um, todos os filhos moram com eles ou
a guarda é dividida, o divórcio não está legalizado,
ou ainda, os dois têm filhos em comum.
Outra confusão dá-se na terminologia,
onde a palavra recasamento em momento algum está associada a repetição,
bem como a palavra madrasta é preconceituosamente ligada a uma figura
má, influenciados pela história infantis.
Também ligado ao uso das palavras, a autora
coloca que a linguagem é poderosa e devemos aproveitar para gerar relacionamentos
mais saudáveis e positivos. O Termo "ex" pode levar à
situações negativas e embaraçosas. Ao invés de "ex-marido",
podemos nos referir ao antigo parceiro como o"pai dos meus filhos".
Muitas vezes, ao entrar no recasamento, o casal
não se dá conta de que cada membro pode estar num momento emocional
com graus de intensidade diferentes um dos outros, em diferentes etapas do ciclo
vital e reagir a esta nova mudança de variáveis formas.
Os adultos conseguem superar suas dificuldades,
expressando-as; a criança lida diferente com estas situações,
gerando tensão e problema.
O recasamento implica mudanças nas rotinas,
rituais, hábitos e valores que envolvem toda a rede familiar e à
cada nova mudança todo um processo de adaptação e negociação
demandam energia para que não crie entraves.
Precisa-se tomar cuidado para não dividir
a população familiar entre aliados e adversários.
Cap.2 - Casar de novo: somar ou dividir?
Do mesmo modo que um casal constrói seu
relacionamento, constrói também sua forma de separar. E cada um
vai ver e delinear esta situação de acordo com suas lentes.
O divórcio e a dor proveniente dele repercute
em cada um de forma diferente. Para quem decide sair de casa, a dor também
existe e para quem escuta um "não quero mais você", além
da dor, a impossibilidade de impedir que algo ou alguém mude sua história
sem que este seja o seu desejo.
Esta combinação de uma vítima
que sofre e de um algoz que maltrata sempre gera profundos ressentimentos.
As questões legais, emocionais, financeiras
de um divórcio influenciam diretamente nas relações de
um recasamento. Quando não há intervalo entre a ruptura e o recasamento,
o novo parceiro é visto como responsável pelo fim do casamento.
Com o recasamento estabelece-se o que a autora
chama de bigamia invisível, onde nas questões dos filhos, os ex-cônjuges
precisam unir-se e apontar soluções.
Novos arranjos tornam-se necessários para
enquadrar antigos relacionamentos e rituais, como por exemplo Páscoa,
Natal, aniversários, etc...
É comum os novos parceiros buscarem, nem
sempre de forma clara e consciente, a legitimação da nova relação,
revelada através do "casar no papel", ritual religioso ou ainda
uma festa de casamento.
Quando há a morte de um dos cônjuges,
ele continua interferindo na dinâmica da família, sem ter que requisitar
pensão, etc... É uma interferência invisível, porém
poderosa. Além disto, ao recasar, uma mãe que tira de casa todas
as lembranças do falecido marido, achando que com isso virou a página
e começa nova história, pode estar agredindo seus filhos que estão
sendo impedidos de relembrar sua história. Deste modo, a criança
trará o pai de volta em forma de sintomas: estes ocuparão o lugar
daquele que não tem mais lugar.
Quando um dos cônjuges, antes do recasamento,
era solteiro, vê com grande desalento todos os seus sonhos tomarem um
rumo completamente diferente do idealizado.
Assim, como para toda família o ideal é
que seus filhos casem e tenham seus próprios filhos, torna-se díficil,
pelo menos num primeiro momento, a aceitação do sistema familiar
de que o filho case-se com uma mulher divorciada com filhos.
Diante de tantas dificuldades e adaptações
a antigos sonhos, o questionamento de onde está o homem ou mulher com
quem sonhei e casei é campo fértil para desentendimentos.
Cap.3 - Fraldas, outra vez?
Um dos aspectos criadores de tensão no
recasamento refere-se a ter ou não filhos comuns.
Para muitos cônjuges os filhos do primeiro
casamento são suficientes e o desejo agora é curtir a companheira.
Para outros, o filho concretizaria a relação,
e em muitas vezes retomaria uma fase "mal-vivida" anteriormente.
Muitas vezes a recusa em ter filhos é vista
e sentida como uma negação da importância desta relação
perante eles mesmos, seus familiares e a sociedade.
Para os filhos, a angústia de não
saberem ao certo que lugar e espaço ocupam na vida e na casa do pai e
da mãe é responsável por muitos aborrecimentos, malcriações
e desgaste entre o novo casal os ex-cônjuges e pais e filhos.
A dificuldade maior é que as crianças
não verbalizam e o caminho utilizado é o sintoma. Torna-se necessário
um movimento dos adultos para inserir os filhos nesta nova realidade e lhes
proporcionar espaço e intimidade. Para estas crianças, cada lugar
perdido - o quarto, a casa, o afeto das pessoas - renova o sofrimento pelo qual
já passaram: a separação dos pais.
O filho do recasamento ocupa a posição
de unificador do lar, e quase sempre carrega uma pesada carga de responsabilidades.
Cap.4 - Rituais: vou de "saia justa"
ou "à vontade"?
É nos rituais tais como casamento, batizado,
formatura, aniversário que essa teia de familiares vai precisar de estratégia
para organizar-se. A localização e posição destinada
à cada um vai determinar sua importância nesta constelação
familiar, e caso lhe desagrade, vai trazer à tona feridas que pareciam
cicatrizadas.
Os rituais cumprem um papel importante para definir
novos padrões de pertencimento.
Cap.5 - Madrasta ou má-drasta?
Socialmente o papel de madrasta está impregnado
de negatividade e carrega consigo a necessidade de defender-se. Diante disto,
a mãe assume papel de santa e todos os defeitos são exclusividade
da substituta.
Em alguns casos de recasamento pós-viuvez,
principalmente quando a morte ocorreu quando eram pequenos, tendem a confundir-se
com famílias de primeiro casamento, intactas. Assim, em pouco tempo,
essa nova família começa a funcionar como se nada tivesse existido
antes, matando um pouco mais o morto, que não é mencionado, não
tem nenhuma foto, não visitam o seu túmulo em datas especiais.
Nessas horas, um filho pode ficar com sua conduta inadequada, denunciando um
conflito de lealdade entre o presente, que lhe oferece coisas boas, e seu passado,
ao qual também quer ser fiel.
A situação se complica quando ocorrem
simultaneamente divórcio e recasamento dos pais com parceiros que tinham
antes da separação. Estes parceiros são identificados como
destruidores de lares.
Para dificultar ainda mais as relações
com madrastas e padrastos, alguns fatos são relevantes. O próprio
recasamento agride pois acaba com a esperança de reunir novamente a família;
a madrasta está no incosnciente coletivo como a bruxa e desta forma,
os adultos devem proteger suas crianças; a madrasta, se tem filhos, os
leva com ela, enquanto, geralmente, os filhos do pai só o visitam regularmente.
O vínculo entre enteados e madrasta é
resultado de uma construção lenta, delicada e muito frágil,
onde a atenção e a sensibilidade do adulto são fundamentais.
Não existe família instantânea.
Cap.6 - É feio falar em dinheiro?
Já é um assunto embaraçoso
e complicado para falar-se, mas no recasamento torna-se mais delicado, quase
um tabu, porque provavelmente em seu processo de separação já
houve tanta briga, ódio e decepção que o assunto é
evitado.
O fato de dividir bens com uma separação
traz à tona lembranças boas ou não que cada foto, fita,
móvel representa e as vezes as pessoas resistem em desfazer-se desta
história. Nestas horas os bens materiais remetem aos bens emocionais
e vice-versa.
O que dificulta também a questão
da partilha é que muitos bens adquirem um valor difícil de mensurar,
pois o que o valoriza são as lembranças embutidas nele.
Ocorre também a desconfiança em
relação à real intenção do outro e o medo
de ser enganado, em algumas situações, mais uma vez enganado.
Um dos problemas referentes ao aspecto financeiro
é a redução da qualidade de vida de cada um após
a separação, onde o homem sempre acha que está pagando
uma pensão muito alta e a mulher acha que está sendo passada para
trás.
Isto, inclusive, chega a ser motivo para que não
ocorra a separação.
Para casais ricos, a discussão fica em
torno dos valores sentimentais, já que o risco de "empobrecimento"
não existe.
Alguns casais, diante da sobrecarga emocional
exigida nas negociações de partilha, preferem se utilizar de terapeutas
especializados na condução desses processos dolorosos. Muitas
vezes deposita-se na disputa financeira a tentativa de aliviar dores, sentimento
de abandono e rejeição.
Cap.7 - Avós, linha de frente ou
retaguarda afetiva?
Muitas vezes pensamos que apoiar e ajudar nossos
entes queridos é dar-lhes razão ou tomar partido. Mas isto, geralmente
dificulta a tomada de consciência do papel de cada um no acontecimento.
Os avós têm a tarefa, num caso de
separação de seus filhos, que são os atores, sairem de
cena e dar retaguarda para seus netos.
Outro aspecto envolvendo a separação
ocorre quando por questões financeiras o cônjuge (geralmente a
mulher) precisa retornar à casa dos pais, levando consigo seus filhos,
tumultuando todos os lados. De repente entram em choque hábitos, rotinas,
horários de três gerações diferentes.
Esta situação angustia quem já
foi independente e agora precisa retornar a uma situação dependente,
de favor. E em muita situações, apesar das crises, os avós
incentivam este retorno e permanência por tempo indeterminado pois já
estão velhos, sentem-se sozinhos, etc...
Diante disto, muitas vezes o recasamento é
visto como uma ameaça ao novo contexto familiar formado, onde sentem-se
novamente potentes. Esta reação pode dar-se de forma explícita
ou velada.
Em muitas situações os avós
não se dão conta do seu poder tanto na articulação
das relações para aliviar tensões quanto para boicotar.
O próprio perfil das vovós e vovôs
mudou. Hoje em dia as vovós dirigem malham, fazem cirurgias plásticas
e algumas já passaram pela situação de divórcio
e recasamento.
Quando o recasamento acontece com homens e mulheres
de meia-idade com parceiros tão jovens quanto seus filhos, os conflitos
são de outra natureza, já que não existe o papel de madrasta,
pois todos estão crescidos. Duvida-se do amor e considera-se o interesse
um aspecto importante e determinante nesta questão.
Apreciação pessoal sobre o livro
Ler Gladis Brun foi um imenso prazer.
Aborda um tema complicado e as vezes indigesto
com clareza e torna-o um leitura agradável.
Com base em seu trabalho clínico, consegue
apontar diversos pontos ligados a problemática do recasamento pouco ou
nada trabalhados por outros autores referente ao mesmo tema.
Questões como a importância dos avós
neste processo, a impossibilidade de existir ex-pai, ex-mãe, ex-avó,
os conflitos envolvendo a guarda dos filhos e as questões financeiras
nos levam a refletir, e creio que qualquer pessoa disposta a separar-se, após
ler este livro, reavaliaria a decisão.
A autora não estimula, nem desencoraja
quem tem este propósito, apenas avalia as implicações desta
decisão.
A leitura me remeteu a uma das discusões
em sala, quando foi colocado que a pessoa precisa preparar-se financeiramente
para separar-se, podendo bancar-se, etc... Gladis coloca a redução
do padrão de vida com a divisão de bens e renda e isto tem que
ser levado em conta, principalmente quando se tem filhos.
No que se refere ao recasamento, considero importante
avaliar como se administrará, como ela mesma chama, uma populaçao
tão numerosa de envolvidos, já que é uma diversidade de
rotinas, hábitos e horários que precisam ser negociados.
Aponta os riscos e armadilhas que os casais recasados
costumam cair, e é clara quando diz que não há receitas
para ter um casamento ou recasamento feliz.
Nome do autor da resenha e data: Leonora Vidal Spiller - junho/2001.