Resenha de Livro
Curso de Formação em Terapia Relacional Sistêmica
Psicóloga Solange Maria Rosset

 

Nome do Livro:

Renascença Organizacional

 

Autor do Livro:

Fela Moscovici

 

Editora, ano de publicação:

Editora José Olympio, 1999, 7° edição

 

Relação dos capítulos

  1. Corações e Máquinas
  2. Luz e Sombra
  3. O Eterno Dilema
  4. Razão e Fantasia
  5. O Despertar dos Executivos
  6. A Organização Holográfica

 

Apanhado resumido sobre cada capítulo

I. Corações e Máquinas

Nesse capítulo a autora aborda o impacto da tecnologia no mundo do trabalho e principalmente na relação homem – máquina. Mostra a grande preocupação da maioria das organizações em investir nos seus recursos tecnológicos (máquinas) em oposição à pouca preocupação das organizações em investir nos seus recursos humanos. Ressalta a importância de resgatar o encontro EU – TU (homem – homem) em oposição ao encontro EU – ISTO (homem – máquina), ou seja, resgatar o humano na tecnologia.

A vida na organização pode ser dividida em dois grupos, de um lado pessoas expressam que o ambiente traz conforto, segurança e satisfação e de outro lado pessoas que se sentem frustradas, ansiosas e enraivecidas, não sendo raro encontrar ambientes de trabalho onde coexistem esses dois grupos.

Ao entrar numa organização o nível de motivação do funcionário é alto, cheio de esperanças e expectativas, mas aos poucos começa a perceber que a realidade é diferente do que ele imaginou, já que a percepção é mais clara sobre o funcionamento da organização, dos colegas, das chefias, etc., aí surgem os obstáculos e dúvidas sobre a carreira e a realização profissional. No meio da carreira, o profissional tem dois caminhos, estar mais próximo do sucesso ou caminhar para a estagnação. E o que faz a diferença entre esses dois caminhos é mais os atributos pessoais de cada um do que os fatores externos. No final da carreira também o profissional pode estar em duas situações, a primeira é de satisfação com os resultados obtidos ao longo da carreira e o outro é de insatisfação crescente com a aproximação da aposentadoria e velhice. A vida no trabalho pode ser dividida em 5 fases: choque de realidade, socialização e crescimento, crise de meio de carreira, aceitação, pré-aposentadoria.

O avanço tecnológico trouxe vantagens, mas também trouxe desvantagens aos profissionais das organizações. O risco de ser substituído por uma máquina, a divisão do trabalho, a impossibilidade de ter a visão do todo, a competição acirrada, o fazer em detrimento do ser, entre outros, são fatores que diminuem a qualidade de vida, geram sintomas e doenças e limitam o espaço para a auto-realização, a alegria espontânea e o encontro humano.

As organizações precisam se atentar que a sua maior riqueza são os recursos humanos, portanto, paralelamente ao investimento tecnológico deve haver investimento nos profissionais, em saúde e educação.

II. Luz e Sombra

As organizações são compostas de luz e sombra. Tudo que a organização valoriza, mostra, focaliza e acredita é a luz e tudo aquilo que a organização desvaloriza, ignora, não mostra ou tenta minimizar o impacto é a sombra. Para compreender a dinâmica de uma organização é necessário o estudo desses dois aspectos, o claro e o escuro das organizações.

A principal forma de entender a luz das organizações é através da análise da cultura organizacional nas suas três dimensões: a material, a psicossocial e a ideológica.  A dimensão material corresponde à estrutura da organização de trabalho (ambiente físico, recursos materiais, tecnologia), a dimensão psicossocial corresponde à estrutura funcional e de poder (relações formais e informais) e a dimensão ideológica corresponde à estrutura das normas e valores (componentes conscientes e inconscientes).

São duas as funções primordiais da cultura organizacional: ajudar a organização em seus problemas básicos de sobrevivência e adaptação ao ambiente externo e ajudar a integrar os seus processos internos, para continuar a sobreviver e adaptar-se.

O lado sombrio das organizações são os aspectos inconscientes, aquilo que os mecanismos de defesa tentam “esconder”, o que fica oculto, desconhecido e inexplorado. Os fenômenos inconscientes podem surgir tanto no nível individual quanto no nível grupal. Um exemplo de luz e sombra na organização se expressa nas situações de comunicação, onde sempre há uma “agenda oficial”, aquilo que será expresso explicitamente, o verbal, o lógico, e a “agenda oculta”, aquilo que será expresso nas “entrelinhas”, os aspectos emocionais, e os mecanismos de defesa.

A teoria dos objetos de transição, de Melaine Klein, pode ser aplicada também nas organizações. Os objetos de transição são necessários para assegurar nosso senso de identidade, nossa relação com o mundo. Mas como o próprio nome diz, eles devem ser “usados” durante um período de “transição” senão podem trazer conseqüências negativas. Como exemplo, um “objeto de transição” pode ser usado para facilitar mudanças nas organizações, trazendo mais segurança e diminuindo a ansiedade entre os envolvidos. O adulto continua com necessidade de objetos de transição que são substituídos por outros no processo constante de mudanças pessoais e organizacionais.

Outros conceitos que podem ser entendidos à luz das organizações é o inconsciente coletivo e os arquétipos de Carl G. Jung.

No fim desse capítulo a autora ressalta a importância dos componentes psicológicos, profundos e inconscientes serem admitidos e aceitos como reais, como variáveis sempre presente em situações de interação humana, caso contrário, as dificuldades de comunicação, relacionamento e trabalho em equipe, continuarão existindo.

III. O Eterno Dilema

Nas organizações os indivíduos deparam-se com o dilema de se posicionar contra ou a favor de determinada mudança proposta. Aceitar ou resistir à mudança é o dilema de cada membro da organização. E até que se faça essa escolha, há uma tensão interior, um conflito que pode gerar um estado de stress.

Ao deparar-se com uma proposta de mudança dentro da organização ocorre a percepção de uma ameaça ao “status quo”, ao estado de equilíbrio, deflagrando três tipos de reações: fisiológicas, psicológicas e sociais. Essas reações são as formas como se manifesta a “resistência a mudança”, a qual pode tomar uma forma ativa ou passiva.

Resistência ativa é quando a pessoa defende-se contra a mudança proposta de forma direta, questionando-a, são os chamados “contestadores”. Já a resistência passiva mostra-se de forma mais sutil, através de um ritmo mais lento nas atividades ou o incremento de atividades supérfluas, são os chamados “sabotadores”. Para a organização é mais fácil lidar com os primeiros do que com os segundos.

A resistência à mudança é uma reação normal, mas a mesma deve ter uma duração transitória, para facilitar a adaptação e a busca de recursos para enfrentar os desafios de uma situação diferente, ambígua e insegura.

Uma forma de entender e compreender as reações frente às mudanças é a parábola da caverna, na obra clássica A República de Platão. A parábola mostra o desafio dos habitantes de uma caverna subterrânea de passarem do mundo das aparências para o mundo da realidade, requerendo coragem para assumir riscos, motivação para mudança e mente aberta. E é possível fazer um paralelo com as organizações onde a maioria das pessoas age como os prisioneiros da caverna, presos em suas crenças que bloqueiam novas idéias e visões.

A perspectiva taoísta é outra abordagem para entendimento dos processos de mudança. A concepção do processo universal de mudança baseia-se na dualidade dinâmica dos opostos, sem estes não haveria tensão nem movimento. Yin e Yang, o primeiro representa o feminino e o segundo representa o masculino. A organização atual sofre do predomínio do Yang, das características masculinas como a racionalidade, objetividade e agressividade, e carecem do Yin, características femininas como a intuição, subjetividade e emotividade.

IV. Razão e Fantasia

O predomínio da razão em nossa vida é evidente, o impacto e a influência das teorias de René Descartes e Isaac Newton sobre o pensamento ocidental perduram até hoje. É o modelo mecanicista que, apesar de ter contribuído imensamente para o progresso científico e tecnológico, trouxe e ainda traz efeitos perturbadores à vida humana, como a divisão cartesiana da natureza e do homem.

As conseqüências disso são: a fragmentação do conhecimento, o reducionismo, a forte crença nas propriedades das partes, a ênfase na especialização e a busca obsessiva de causalidade linear para explicação dos acontecimentos e resultados.

Mas com a chegada do século XX surge uma nova revolução científica, questionando e substituindo os conceitos básicos da mecânica newtoniana e da física clássica.

O pensamento humano pode ser dividido em duas modalidades, o pensamento convergente, em que várias idéias iniciais transformam-se numa idéia final conclusiva, é linear e ocorre a separação do todo em partes menores. Já o pensamento divergente começa com uma idéia que abre espaço para várias alternativas, todas as idéias são consideradas, é a modalidade criativa do pensamento. As organizações estão percebendo a importância desse tipo de pensamento existir na sua cultura, deve haver um espaço para a não-racionalidade, para a brincadeira e a espontaneidade, abrindo portas para a criatividade.

Uma outra aprendizagem que as organizações e seus integrantes deve fazer é em como desfrutar do progresso tecnológico sem chegar ao stress. São 4 os fatores de risco que podem levar ao stress: 20% são biológicos, 20% são ambientais, 10% são dos serviços de saúde e os 50% restantes são atribuídos a escolhas de estilo de vida.

E três são as premissas de controle sobre a sua saúde: a do pavão, a da profecia auto-realizável e a da finalidade mais elevada. A primeira refere-se ao potencial de beleza e grandeza que existe em cada um e que precisa ser descoberto e mostrado publicamente. A da profecia auto-realizável diz que a auto-imagem tem influências diretas no comportamento e nos relacionamentos interpessoais. E a terceira premissa refere-se ao que o indivíduo busca ao fazer escolhas, baseado em seus valores e propósitos de vida. Se essas premissas forem colocadas em prática, a possibilidade de surgir o stress é menor, e a realização pessoal é mais certa.

O maior desafio das organizações e seus líderes é admitir e acolher a brincadeira, a espontaneidade e a não-racionalidade como aspectos naturais da dinâmica organizacional, assim como a racionalidade, a lógica, os processos e procedimentos.

V – O despertar dos executivos

Um executivo deve ter competências técnicas e comportamentais, mas são essas últimas que os diferenciam das máquinas e que permite a gestão de tecnologias. Um alto executivo não precisa ser um grande especialista na sua área de responsabilidade, mas precisa ser um generalista que possua competência interpessoal, sabendo dialogar e relacionar-se com pessoas de dentro e fora da organização, em diversos níveis.

Diversas são as teorias que podem ajudar a entender a personalidade e a forma de se comportar das pessoas, e uma das mais utilizadas nas organizações é a teoria dos tipos psicológicos de Carl G. Jung, baseada em duas atitudes fundamentais: a introversão e a extroversão.

A introversão caracteriza-se por uma orientação maior para dentro de si, e a extroversão caracteriza-se por uma orientação maior para o mundo exterior.

Também existem as funções psíquicas, as quais são quatro e formam duplas opostas: pensamento e sentimento, sensação e intuição. Todos têm essas 4 funções, mas há o predomínio de uma sobre as outras, a qual é chamada de função principal, a sua antagonista é a função inferior, e as demais são as funções auxiliares. Pensamento e sentimento são funções de julgamento de situações, objetos e pessoas. A sensação e a intuição representam modalidades da percepção. A sensação é a impressão física causada por estímulos externos ou internos captados pelos órgãos dos sentidos e órgãos internos. A intuição é uma apreensão inconsciente, de um todo, sem passar por mecanismos localizados.

A combinação das atitudes e das funções psíquicas determina diferentes tipos psicológicos, os quais podem ser identificados através de um inventário chamado MBTI (Myers-Briggs Type Indicator), muito utilizado atualmente nas organizações.

Também com base na tipologia de Jung, W. Torbert (1983) criou a matriz de mentalidades dos executivos, onde através da combinação das funções de julgamento (pensamento e sentimento) e percepção (sensação e intuição) pode-se chegar a 4 tipos de mentalidades: científica, executiva, teórica e passional. A grande contribuição para a realização de pessoas e grupos, dessa teoria, é os executivos equilibrarem observação, estratégia e paixão.

Geralmente, um executivo atinge a plenitude da sua mentalidade na segunda metade da vida, quando é mais capaz de reconhecer e lidar com a sua própria vida, o ritmo de sua empresa e a dos eventos históricos mundiais.

O comportamento dos executivos também pode adquirir traços neuróticos, através de atitudes estereotipadas e rígidas, sem espontaneidade e autenticidade. A autora coloca que a cultura tecnológica atual acentua valores materiais de posse e poder, e isso pode ser o desencadeador de atitudes neuróticas das pessoas nas organizações.

A influência a nível organizacional desses comportamentos pode ser maior ou menor, dependendo da quantidade de executivos com esses traços e da influência deles sobre os outros.

Por outro lado, um estilo sadio de liderança e gerência é aquele em que a pessoa busca a conciliação entre as exigências de seu papel organizacional e sua personalidade. É quando a pessoa exerce suas atividades de maneira espontânea e autêntica. A utilização de estilos situacionais são os mais pertinentes, por serem flexíveis e adaptáveis às mudanças internas e externas.

As competências indispensáveis para um executivo são três: as funções clássicas, as funções de transição e as funções futuras ou de “ponta”. As primeiras são as de ordem conceitual, técnica e humana; as segundas são as competências técnicas, interpessoais, empresarial e de liderança; e as terceiras referem-se a: aprender a aprender, criar visões compartilhadas, planejar e conduzir transições, colaboração ambiental, análise organizacional, configuração organizacional e potencialização de si e dos outros.

Resumindo tudo isso, para executar de forma sadia e competente as suas funções o executivo deve estar em equilíbrio com os quatro níveis do ser humano: físico, mental, emocional e espiritual, o que constitui o cerne do modelo holístico, e o qual abre um espaço promissor para recuperar a dimensão humana na organização tecnológica e valorizar o ser humano além das máquinas.

VI. A organização holográfica

A forma de compreender o mundo vem mudando com o passar do tempo, a visão analítica, lógico-causal e impessoal da natureza está transformando-se em uma forma de ver o mundo como um todo integrado, onde o cientista passa a ser um participante ao invés de um mero observador, e um influencia o outro. O mundo é considerado como uma teia dinâmica de fenômenos inter-relacionados.

O holismo, como tendência de sintetizar unidades em totalidades organizadas vem sendo crescentemente adotado como abordagem em diversos campos da atividade, inclusive nas organizações.

O termo holismo surgiu da palavra holon criada por Arthur Koestler (1969), o qual tem duas tendências contrárias: tendência integrativa, quando funciona como parte de um todo maior; e auto-afirmativa, que mantém sua autonomia individual. São duas tendências opostas, mas complementares.

Nas organizações, os sistemas e subsistemas podem ser vistos como holons mantendo o equilíbrio entre as tendências de integração e auto-afirmação. Cada um preserva sua individualidade e, ao mesmo tempo, interage com os outros de forma harmônica.

O trabalho e as tarefas num sistema holográfico aconteceriam conforme as demandas e os problemas que surgem durante o processo, e os membros do sistema são as partes e também são o todo.

A autora finaliza o livro acreditando que é possível máquinas e corações funcionar em harmonia, sincronizando os batimentos pelo ritmo humano. Por fim, a proposta do livro é revalorizar o homem face à tecnologia, é propor uma autêntica “Renascença Organizacional”.

 

Apreciação pessoal sobre o livro

Durante a leitura do livro a autora convida o leitor a fazer uma análise crítica do “mundo organizacional” e suas particularidades. Aborda as questões da organização a partir de uma “visão sistêmica”. A leitura do livro me ajudou a “enxergar” e perceber as questões das organizações de uma maneira diferente e mais ampla.

 

Nome do autor da resenha e data:Mariana Zanona, agosto de 2011.